Archive for the ‘Entrevistas’ Category

Novas mídias e liberdade

01/03/2013

MARÇO 2013

Entrevista concedida ao jornalista Raphael Mendonça, do jornal da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em março de 2013.

Primeiro, o que são as chamadas novas mídias? Qual o contexto delas no Brasil? Elas surgem, de maneira geral, como plataforma positiva?

As novas mídias, assim tout court, geralmente referem-se às mídias decorrentes das novas tecnologias de informação e comunicação. O contexto de uso no Brasil não difere muito do restante do planeta onde são adotadas pela maioria das pessoas, sendo nosso país um que se destaca pela intensidade e penetração da adesão a essas tecnologias, inclusive nas camadas da população de menor renda.

Isso é muito positivo também pela inclusão que propiciam, facilitando a articulação da cidadania mesmo que carenciada em itens essenciais da civilização, como saneamento básico, justiça e outras mazelas, pois a apropriação tecnológica e o acesso à informação são cada vez mais elementos estruturantes da consciência social e da inserção no mundo.

A blogueira cubana é grande exemplo do uso da mídia como forma de expressão e busca pela liberdade, já que vive restrições em seu país. As novas mídias surgem como um escape nesse sentido? Não há controle sobre a informação? Qualquer um posta o que quiser, onde quiser, de diferentes maneiras?

A referida blogueira é, a meu ver, mais um caso de uso político e marketing com outras finalidades do que um exemplo de forma de expressão e busca pela liberdade (seja pelos seus patrocinadores, seja pelos detratores). A forma como o “case” tem sido tratado é extremamente parcial e manipulado, sem questionamento inclusive ao financiamento da mega-operação de seu périplo. As alegadas restrições (Quais mesmo? Pois ganhou fama internacional por publicar um blog que não sofre qualquer tipo de bloqueio, ao contrário da economia da ilha, não foi impedida de sair e ao que consta não está impedida de voltar) poderiam ser vistas com muito mais propriedade no cidadão norte-americano que está preso sem julgamento, com suspeita de maus-tratos e torturas, acusado de vazar informações sobre crimes de guerra para o Wikileaks…

As novas tecnologias e as mídias e redes sociais possibilitam novas formas de expressão e democratização da circulação de informação – cada vez mais dominadas num mundo onde a posse das mídias está cada vez mais centralizada e monopolizada, com concentração de interesses econômicos de grandes grupos de comunicação fortemente centrados mais nos negócios financeiros do que na efetiva liberdade de expressão e acesso à informação e conhecimento (em nosso país, menos de uma dezena de famílias domina a quase totalidade da posse dos jornais, revistas, televisões e rádios, só para dar um exemplo) – porém não é por si só que a liberdade de manifestação e expressão se dá.

A mesma tecnologia que permite qualquer ser humano ser um protagonista da comunicação possibilita também que governos e órgãos de controle e repressão mapeiem, de forma mais eficaz do que qualquer outra já existente até hoje, onde as pessoas estão, que palavras elas usam (não só em seus blogs e redes sociais, mas em seus e-mails pessoais e conversas provadas em chats e torpedos), como também onde estão, a que horas foram a que lugar e com quem estiveram. Ou seja, assim como a metalurgia possibilita construir meios de transporte para facilitar a vida de todos e permite a feitura de armas de morticínio cada vez mais letais, também as novas mídias podem levar a uma liberdade de expressão e informação cada vez maiores ou a formas de repressão jamais vistas.

De que maneira a era digital pode ajudar na educação e na aprendizagem?

As novas tecnologias digitais possibilitam que coisas antes só imaginadas no terreno da magia sejam possíveis. Classes inteiras podem “viajar” com seus professores para qualquer lugar do planeta ou da galáxia, por dentro do corpo humano ou fazer viagens no tempo, acessar música e literatura de todos os idiomas e épocas, cruzar informações, criando possibilidades totalmente novas para a aprendizagem. Claro que isso não ocorre espontaneamente, necessitando, como sempre, de professores motivados, engajados, com imaginação pedagógica, e de projetos bem estruturados e metodologias para que não se caia na falsa expectativa que a tecnologia resolva tudo por si só.

Entrevista com Carlos Seabra sobre microcontos

11/06/2011

JUNHO 2011

Vídeo da conversa online sobre microcontos na educação, feita por Luiz Henrique Gurgel, em 11 de junho de 2011 no Cenpec, para a Twitcam da Comunidade Virtual da Olimpíada de Língua Portuguesa, do projeto Escrevendo o Futuro.

 


Um universo pedagógico a explorar através das novas tecnologias

01/02/2011

FEVEREIRO 2011

Entrevista  para a publicação Educação em Revista, do Sindicato do Ensino Privado (SINEPE/RS), edição 84, de fevereiro/março de 2011.

Pergunte a um jovem o que ele gosta de fazer nas horas vagas. Entre as preferências de 99,9% dos entrevistados está a internet. Hoje, é inquestionável a presença da web na vida dos estudantes, e a pergunta que fica para muitos educadores é como transformar os recursos da web em ferramenta pedagógica eficaz para a aprendizagem. Na opinião do consultor e coordenador de projetos de tecnologia educacional e redes sociais, Carlos Seabra, o primeiro passo é o professor se apropriar das tecnologias, para ent”ao pensar como fazer uso delas em sala de aula. Mas ele adianta que n”ao existe receita pronta para isto, é preciso experimentar.

Diante desta nova realidade, o especialista ressalta que o papel do professor não é mais o de ser quem domina todas as informações e as repassa aos alunos, mas sim alguém que os acompanha na pesquisa dessas informações, estimulando o pensamento crítico e autônomo dos alunos, preparando-os para aprenderem a aprender.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista realizada com o consultor em sua passagem por Porto Alegre, quando fez palestra no Fronteiras da Educação – Diálogos com Professores.

Muitos professores se veem em uma difícil tarefa na sala de aula, não conseguem falar a mesma língua de seus alunos, que já nasceram na geração digital. Qual o conselho que o senhor dá a estes professores ‘analógicos’?

Que coloquem a “mão na massa”, que experimentem, que se apropriem. Sem isso, abrir-se-á um grande fosso entre eles e seus alunos, e mais ainda, entre eles e um mundo cada vez mais digital.

É fundamental que as tecnologias, disseminadas em larga escala e que estão sendo usadas até pelas classes mais carentes, sejam pensadas também do ponto de vista dos educadores, que as usem em seu quotidiano, em sala de aula, para se atualizarem, para fazerem um uso pedagógico das mesmas.

O uso das tecnologias pode substituir a figura do professor?

Um professor que possa ser substituído por uma tecnologia, deve sê-lo! Isso só ocorrerá se ele não for um professor de verdade, pois este tem seu papel cada vez mais importante na chamada sociedade da informação e do conhecimento.

Assim como uma mãe não pode ser substituída por quaisquer tecnologias, por mais que estas a auxiliem a cuidar de seu bebê – ninguém pergunta se uma geladeira pode substituir uma mãe – também nenhum artefato tecnológico pode substituir um professor, até porque tecnologia é antes de tudo uma questão de “cabeça” e portanto isso pressupõe um professor estimulador e facilitador, que necessariamente deve se apropriar e dominar essas tecnologias.

Como fica o papel dele, tendo em vista esses novos recursos?

O papel do professor é cada vez mais o mesmo: que ele deveria ser sempre, um estimulador da aprendizagem, que saiba perceber o que se passa na cabeça de seus alunos, que identifique suas dificuldades de aprendizagem, que procure criar estratégias facilitadoras da construção do conhecimento.

O papel do professor não é mais o de ser quem domina todas as informações e as repassa aos alunos, mas sim alguém que os acompanha na pesquisa dessas informações, estimulando o pensamento crítico e autônomo dos alunos, preparando-os para aprenderem a aprender.

O senhor acha que as redes sociais podem servir como ferramenta pedagógica? De que forma?

A forma em que as redes sociais podem servir como ferramenta pedagógica, e certamente elas têm esse grande potencial, é justamente um desafio para os próprios professores procurarem essa resposta!

O contexto está dado: as redes sociais são usadas pelos alunos de forma intensiva e um professor que apenas acompanhe o que seus alunos ali escrevem, que veja os interesses, os assuntos sendo discutidos, que perceba como eles se comunicam, como articulam suas discussões, esse professor terá no mínimo um conhecimento ímpar de como seus alunos pensam e como interagem.

Como o professor pode estimular seus alunos a usar a web não apenas para copiar dados?

A web veio para matar de vez a pseudo-estratégia de pedir aos alunos para pesquisar um assunto e considerar que a mera cópia escrita à mão com caneta num papel, tirada de uma enciclopédia ou outra fonte, resolvia a tarefa. A informática, permitindo o copiar e colar com o gesto de um mouse, e o acesso à vastidão de informações disponíveis na web, colocaram em cheque essa visão.

Os alunos somente copiarão os dados se a tarefa solicitada for essa. Mas se a tarefa dada pelo professor exigir construção, elaboração, será impossível limitar-se a copiar. Por exemplo, se um professor pedir aos alunos que pesquisem sobre répteis, primatas, felinos, e escrevam como se um jacaré, um macaco ou uma onça soubessem escrever e se expressar em nossa linguagem, os alunos terão que transformar as informações coletadas sobre hábitos de alimentação, tempo de vida e habitat, em algo que é impossível de copiar pois a natureza da tarefa dada impossibilita isso.

E quanto a outros aparelhos multimídia, como celulares, MP4, ipad, o senhor acha que podem ser ferramentas úteis na sala de aula? Como devem ser usados?

Esse é um grande desafio! Sem dúvida que necessitam ser usados, mas o caminho passa por inúmeras questões que não são novas mas ficam bastante agravadas com essas tecnologias. Há que se evitar, por um lado, o simples banimento da sala de aula ou da escola, e, por outro lado, evitar também que sejam distrações que prejudiquem a aprendizagem, tirando o foco do que realmente interessa – que é o processo de construção do conhecimento.

Como usar um livro ou um filme em sala de aula? Certamente boa parte dos professores terá algumas respostas para isso, embora saibamos o quão ainda são mal utilizados em sala de aula esses recursos. Assim como não basta pegar um filme e exibi-lo em sala de aula (é necessário pensar atividades antes ou durante sua exibição, além de talvez exibir apenas um trecho significativo) também não se trata de “liberar” o uso do telefone celular em sala de aula.

É necessário pensar nas ações, nas tarefas, nos processos cognitivos envolvidos, ter uma estratégia pedagógica, seja para o uso de celulares seja para tablets ou mesmo computadores. E pensar isso pensando não só na sala de aula mas também na integração com outros momentos da vida dos alunos, em suas casas, em atividades extra-escola etc.

Quais os benefícios destas novas tecnologias para o desenvolvimento cognitivo dos alunos?

As novas tecnologias de informação e comunicação são extensões do cérebro, permitem concretizar conceitos, juntar dados a informações significativas, desenvolver projetos que exijam a aplicação prática de conceitos teóricos…

Mas é necessário levar em conta que o mero uso dessas tecnologias não garante maior domínio da linguagem ou do raciocínio, não assegura a formação cultural nem o desenvolvimento de cidadãos, pois isso somente é assegurado quando há uma afetiva apropriação pelo projeto pedagógico, e esse é o desafio que torna os professores o elemento central dessa questão.

Quando estas novas tecnologias podem interferir no aprendizado, de forma negativa?

Quando são meros distratores, quando não são utilizadas de forma integrada em estratégias de ensino e aprendizagem. Assim como papel e lápis por si não resolvem nada e até podem ser usados para produzir material preconceituoso, racista ou sexista, assim como o audiovisual pode apenas tirar a atenção e o foco de uma aula, tudo o que não seja pensado e não tenha uma proposta de uso consistente pode impactar negativamente.

Não existem receitas prontas nem ditames a seguir. O grande desafio é justamente esse: os educadores devem se apropriar das tecnologias para pensar que usos podem fazer delas. E não ter receio de experimentar, de errar, nem tampouco cair na armadilha de acreditar em soluções prontas e mágicas!

Como desenvolver o senso crítico nos jovens de hoje, para o uso consciente da internet e das redes sociais?

O desenvolvimento do senso crítico é um dos esteios da educação, sem dúvida. O uso da internet e das redes sociais apenas permite maior integração e transparência das relações entre os alunos e deles com assuntos e temas de seu interesse. Cabe aos educadores aproveitarem a possibilidade aberta por essas tecnologias para acompanhar mais de perto os jovens e construir, em conjunto com eles, novos processos integradores da formação crítica de cidadãos, de artistas, cientistas, profissionais, de seres humanos na mais plena acepção!

Como explicar que, em meio a tantos recursos tecnológicos, a qualidade do ensino continua deixando a desejar, já que os resultados das avaliações continuam comprometendo a imagem do país? Neste sentido, a tecnologia poderá ajudar a superar esta situação?

Não basta colocar um monte de computadores, DVDs e outros artefatos nas escolas. É preciso focar os esforços nos processos de ensino e aprendizagem, de modo criativo e crítico, buscando aliar a inovação tecnológica, o lúdico e o motivacional, com a seriedade pedagógica que tantas vezes sucumbe ante as rotinas desmobilizadoras e desinteressantes que são os verdadeiros geradores dos resultados dessas avaliações, que colocam nosso país num patamar muitas vezes inferior a seu real potencial.

 

Confira dicas práticas sobre como usar os recursos tecnológicos para tornar a aula mais atrativa:

Incentive a produção audiovisual: A maioria dos celulares possibilita a gravação de pequenos vídeos. Máquinas fotográficas digitais também permitem filmagens. O projeto pode ser um trabalho individual ou em grupo, uma ficção desenvolvida a partir de um roteiro feito pelos alunos ou um documentário comk tema e objetivos bem definidos. O produto final pode ser postado em um site, como o You Tube, o maior acervo de vídeos na internet.

Trabalhe com o som: O som é outra interessante possibilidade de uso na escola, na forma de músicas, entrevistas em programas de rádio, trabalhos em grupo apresentados em áudio. Você pode pedir aos alunos que façam trabalhos extraclasse, como a gravação de entrevistas, a simulação de um programa de rádio com temas específicos, ou mesmo uma gravação musical. Os trabalhos podem ser publicados na internet, por meio de podcasts, blogs ou audioblogs e sites específicos de compartilhamento de arquivos sonoros.

Explore as imagens: Para trabalhar com imagens e fotografias, um exemplo seria explicar aos alunos que Cristóvão Colombo, durante suas viagens, registrava todas as suas impressões em um diário de viagem. Para ilustrar seus relatos, as páginas eram acompanhadas de várias figuras das regiões por onde ele passou. Era pela pintura e pela ilustração que se registravam os acontecimentos passados. Após essa explicação aos alunos, você pode solicitar que eles pesquisem imagens na internet para ilustrar um determinado tema, ou que registrem por meio de fotografias acontecimentos que considerem importantes ou até mesmo curiosos. O resultado final pode ser apresentado para a turma, por meio de exposição nas paredes da sala ou em algum álbum online (como o Flickr ou Picasa), blog ou fotolog.

Fonte: Cartilha “Tecnologias na escola”. Acesse o material em:  www.scribd.com/doc/41921420/Tecnologias-na-Escola

Entrevista no Formspring do Instituto Claro

10/01/2011

JANEIRO 2011

Respostas para as perguntas formuladas no Formspring do Instituto Claro, feitas em dezembro de 2010 e respondidads em janeiro de 2011.

O Instituto Claro tem como causa Empreender para Educar e Educar para Empreender. Confira as respostas de Carlos Seabra sobre o uso das tecnologias na educação.

Carlos Seabra tira dúvidas dos leitores sobre como as tecnologias potencializam a aprendizagem

Olá. O Instituto Claro agradece a todos os internautas que mandaram suas dúvidas sobre como a tecnologia potencializa a educação. Carlos Seabra responde logo abaixo. Confira!

Por gentileza, como potencializar o ensino através da tecnologia, para o público mais carente? Obrigada, Silvia Moura

A cada dia, mais pessoas das classes mais carentes têm acesso às novas tecnologias, incluindo internet e celulares. Mesmo a imensa parcela da população que ainda não tem acesso será incluída, com o barateamento do custo dos equipamentos e políticas de universalização. O grande desafio é desenvolver estratégias pedagógicas, atividades motivadoras e projetos que levem à construção do conhecimento, pensando-se em promover uma “inclusão cognitiva” para além da chamada inclusão digital.

Olá, Carlos. Você incluiria o blog como uma tecnologia educacional que pode potencializar o currículo?

Sem dúvida, os blogs são uma interessantíssima ferramenta que, se usada no contexto educacional, pode ser uma grande aliada dos profissionais de educação. Informações apresentadas explorando diversos assuntos, seja no formato de diários, contos, notícias, poesias, artigos etc., podem despertar uma nova onda de produção escrita em muitos jovens. Os blogs são uma excelente forma de comunicação, permitindo que seus autores se expressem de acordo com suas convicções e visões de mundo e que outras pessoas possam ler e registrar comentários sobre a produção textual do blog. Isso vale tanto para professores terem seus blogs individuais, compartilhando pensamentos e informações com seus pares ou com pais e alunos, quanto para uma classe ter um blog coletivo, ou os alunos fazerem blogs em grupos ou individualmente.

Bom dia Carlos. Trabalho com crianças de escolas públicas com problemas de aquisição da leitura e escrita na imago.org.br. Como as novas tecnologias potencializam a aprendizagem?

As tecnologias potencializarem a aprendizagem é um fato se houver o engajamento dos professores e dos alunos em projetos específicos, pois não é algo que ocorra espontaneamente, a não ser em casos esporádicos. Engajar os alunos em atividades que levem à leitura e escrita, seja em processos de comunicação escrita com alunos de outras cidades, produção de pequenos contos ou poesias, ou minirreportagens e publicação em blogs, são alguns exemplos de possibilidades que permitem que esse potencial redunde em estímulo e facilitação da aprendizagem.

Eu tenho alguns Projetos de Inclusão Digital, Gostaria de Saber qual a melhor forma de poder divulgar apresentar estes projetos com uso das tecnologias que potencializam a aprendizagem ? email: fernandoinstrutor.tecnologia@hotmail.com

Se a intenção é apenas a divulgação, a melhor forma é a criação de um website, ou mesmo um blog, além de usar as redes sociais para sua divulgação, tais como Twitter, Facebook, Orkut etc. Mas, se a intenção é conseguir apoios viabilizadores, você deve procurar, através de um release bem resumido, contactar empresas, jornalistas, educadores e ficar atento a editais na área. Lembre-se: nem sempre a melhor das intenções viabiliza projetos, é importante dar-lhes um formato claro, que mostre seu diferencial e possua estrutura objetiva, com metas a alcançar e custos bem definidos.

Sonhei e Realizei, formei 3 turmas em gestão de pequenas empresas, com a tecnologia do telecurso TEC, o curso parou não sei se continua no ano que vem, aprendi com a praxis. Voce acha que o aprender ensinar vai se fazer naturalmente com a tecnologia?

Aprender a ensinar e aprender a aprender são competências básicas que não decorrem naturalmente da tecnologia em si, mas que podem e devem ser enormemente facilitadas por ela. Acreditar que a tecnologia, por si só, garanta avanços transformadores é um equívoco, propalado por vendedores de equipamentos e de softwares e por fanáticos tecnológicos. Educação a distância é um caminho muito promissor, mas que exige um investimento de desenvolvimento e uma atenção redobrados, como você deve ter vivenciado.

Como poderiamos melhorar a educação com os recursos da tecnologia, incentivando principalmente o educador a utiliza-la sem medo de perder o seu lugar no mercado de trabalho?

Um educador ter medo de perder seu lugar para recursos tecnológicos é algo tão descabido quanto uma mãe temer ser trocada por uma geladeira, que é um recurso tecnológico de apoio à alimentação de seus filhos – tanto quanto o computador é uma extensão do cérebro do professor e de seus alunos. Os professores devem ter medo é de ter medo, devem recear a falta de curiosidade, a ausência de experimentação. Estar aberto aos recursos da tecnologia é também uma forma de estabelecer novas parcerias com os alunos, engajando-os em processos de aprendizagem colaborativa.

Bem,que a tecnologias ajuda no apredesado isso nós sabemos, mais a questão é si maramos em um pais que á maioria não tem três refeiçois basicas par dia como essas pessa tec.era pontencializar ou acelera,ajudar no aprendizado do nosso povo.(alimenti

Todo esforço e atenção investidos na superação dos fossos sociais que temos em nosso país redunda em melhorias visíveis em qualidade de vida e em seus indicadores de saúde, alimentação, cultura e educação. Além das três refeições básicas a que você se refere, é fundamental uma quarta refeição diária, que é a do espírito, do intelecto. Nesse sentido, a tecnologia pode e deve ser usada como um “cavalo de Troia”, que permita ultrapassar as muralhas da clivagem social e dar novos saltos de qualidade de vida.

Como voce vê a tecnologia como uma nova ferramenta de aprendizagem? Já que na maioria das vezes acaba com vinculo social e troca de experiências.

Vínculos sociais e trocas de experiências podem ser componentes preciosos para a facilitação e o estímulo à aprendizagem, desde que inseridos em um projeto de ensino e cujos resultados sejam permanentemente acompanhados e (re)avaliados. A verdadeira ferramenta de aprendizagem são nossos cérebros (com uma pitada de ajuda dos nossos corações, olhos, boca e mãos), e devemos encarar as tecnologias como próteses extensoras de suas capacidades.

Como podemos alinhar o uso da tecnologia ao paradigma com a utilização dos recursos naturais? Não parece um contra censo

As tecnologias podem ser um poderoso aliado do uso sustentável dos recursos naturais (ao buscar uma informação na internet você não precisa se deslocar fisicamente para obter o mesmo resultado) ou comprometê-los (caso dos motores a combustão com efeitos altamente poluidores). Assim, não se trata de nenhum contrassenso, ao contrário, pois tecnologia na plena acepção do conceito pressupõe levar em conta todos os aspectos envolvidos. Mas isso não significa não nos preocuparmos permanentemente com aspectos ligados ao lixo tecnológico, à emissão de radiações e outros.

Como usar o celular para incrementar minhas aulas de ciência no 1º grau?

O celular pode ser usado em sala de aula, e também fora dela, como complemento ou centro de algum projeto pensado especificamente para seu uso. Por exemplo, usando o celular para fotografar determinados objetos solicitados pelo professor ou numa gincana de conhecimentos em que os alunos consultem fontes externas usando seus celulares. O fundamental é que seja uma estratégia pensada e elaborada pelo professor, que com os erros observados e os avanços identificados vá desenvolvendo sua metodologia.

Olá, Prezado Senhor Carlos Seabra !!! Gostaria de saber do senhor se, nos dias de hoje, é possível aplicar Metodologias de Aprendizagem que possam se utilizar de Conceitos de Civismo aplicados em Escolas Públicas em nosso País? Muito Agradecido. Ma

O civismo consiste nas atitudes e no comportamento assumidos pelos cidadãos, fundamentais para a vida coletiva. Como cultura política a ser construída, necessita de uma metodologia de aprendizagem que seja motivadora e engajadora. O uso de tecnologias de informação e comunicação também nesta área pode ser bastante efetivo, rompendo o tratamento “careta” e conservador tantas vezes dado a esta questão.

gostaria de saber quais os caminhos mais viaveis para tirar um projeto do papel e colocalo em pratica, pois ja tentei atraves do instit.claro mas nao soub trnsmitir realment meus objetivos que tenho certeza sera de grande importanc. economc. e socal obr.

Um projeto para sair do papel e ser colocado em prática depende em grande parte de uma feliz combinação de oportunidade e de competência. Como já foi dito em resposta anterior, é importante que o projeto tenha um formato claro, mostrando seus diferenciais em relação a outros semelhantes, com uma estrutura objetiva, definindo metas a serem alcançadas e, claro, com os custos bem listados e definidos. Ao formatar o projeto, procure vê-lo não como você o imagina mas sim como a pessoa, ou instituição, a quem o vai apresentar.

Trabalho com alunos do ensino fundamental na rede pública a utilização do celular como recurso de aprendizagem. Gostaria de saber como conseguir parceria junto a operadoras de telefonia móvel para tornar meus projetos mais significativos. Grata.

O primeiro passo, com certeza, é você divulgar como tem usado o celular como recurso de aprendizagem na escola pública. Uma grande dificuldade (existem muitas outras, infelizmente, sendo das maiores os custos envolvidos, que no Brasil estão entre os maiores do mundo) é a diversidade de operadoras que os alunos usam, o que dificulta o apoio de uma operadora a ações envolvendo celulares de outras. Há usos do celular que não necessitam de ligações de voz, mensagens de texto ou tráfego de dados, mas sabemos como é empobrecedor lidar com essas limitações, pois afinal cada dia mais o celular (principalmente os smartphones) é um computador no bolso de cada um.

Sr Seabra, Como desenvolver a aprendizagem de crianças e adolescentes carentes que não tem, ou tem pouco acesso as tecnologias modernas, se elas não tem como adquiri-las?

Quando surgiu a televisão, que era um aparelho caro e para poucos, os educadores tiveram uma postura omissa, quando não reacionária. Poucos anos depois, a TV estava em todos os lares. O mesmo acontece hoje com os computadores, a internet, os celulares: a cada ano, parcelas mais e mais numerosas da população têm acesso a esses recursos. Populações que ainda não têm água e esgoto, carentes de saúde e educação, já têm acesso à tecnologia. Isso deve mudar nosso foco de preocupação.

Bom Tarde Professor O estado do Piaui 19 por cento de sua população não é alfabetizada na maioria estão na faixa étaria acima dos 40 anos, como utilizar a tecnologia educacional para reduzir estes índices? AURI DIAS – ADSBP Presidente

A alfabetização, ainda mais em adultos, não é um assunto trivial, embora deva ser uma prioridade em qualquer política pública. Essa população não alfabetizada certamente assiste à televisão e boa parte se comunica telefonicamente, certo? Um dos grandes potenciais da tecnologia é ampliar a realidade, fazer simulações, criar contextos lúdicos, e isso tudo pode e deve ser pensando em conjunto com as metodologias de alfabetização. Segundo Paulo Freire, a leitura do mundo sempre precede a leitura da palavra – nesse sentido, as novas tecnologias de informação e comunicação possuem condições ímpares para fazer a ponte entre essas duas leituras, do mundo e da palavra, cabendo aos educadores a descoberta e a elaboração dessas possibilidades.

Como as tecnologias podem ser nocivas ou beneficiam as formaçoes das redes sociais

Como podemos observar pelas redes sociais que se desenvolvem através da internet (Twitter, Orkut, Facebook e outras), as tecnologias na web, e sua interconexão com a mobilidade (celulares, smartphones e tablets), são poderosos e naturais instrumentos para que a humanidade faça o que sempre fez desde o início de nossa espécie: tecer relacionamentos, físicos ou virtuais, envolvendo finalidades profissionais, sexuais, amizades, casamentos, negócios… Como isso pode ser usado na educação é algo que necessita, principalmente, de acompanhamento e engajamento proativo dos professores, que podem através desses ambientes acompanhar, mais do que nunca, como seus alunos pensam, como se expressam, e assim desenvolver e adequar suas estratégias pedagógicas.

Como usar, e/ou onde encontro exemplos, da utilização do celular na educação? É um aparelho presente na vida de praticamente todo estudante, mas que se tornou mais um objeto de conflito em sala de aula do que de oportunidade.

Essa é uma interessantíssima possibilidade ainda pouco estudada e aplicada, que como você destaca é mais um motivo de conflitos e proibições do que uma real oportunidade de ferramenta de ensino e aprendizagem. Esse conceito é conhecido também como “m-learning” (mobile learning, ou aprendizagem por celular), procure referências a respeito na web. A grande preocupação e receio dos educadores é com o potencial desvio de atenção que os alunos podem ter: imaginemos durante uma aula eles ficarem a conversar com namorados, familiares ou amigos! Mas o mesmo potencial distraidor podem ter as canetas e folhas de papel, pois um aluno pode não prestar atenção à aula e fazer outras coisas com esses recursos. Claro que o exemplo é fraco, pois o potencial de distração do celular é muito maior, canetas e papéis não tocam e não fazem outras tantas coisas… O principal, a meu ver, é uma experimentação e uma pactuação do professor com os alunos: experimente discutir com eles os limites e as possibilidades, como uma abordagem inicial.

Tenho trabalhado com produção de vídeo-aula em matemática, e gostaria de tornar minhas aulas mais interativas e eficiente, entretanto, não encontro nenhum material, textos, com o tema “como as tecnologias potencializam a aprendizagem”. Qual sua

O uso de audiovisual em aulas é pleno de potencial e abordarei aqui apenas dois aspectos. Um é usar filmes em sala de aula: é necessário selecionar trechos, pois vídeos muito longos só levam à perda de atenção (o ideal é algo em torno de oito minutos de duração), e fazer uso das pausas e mesclar a exibição com o debate, a verbalização, e juntar isso a outras atividades (redação, desenho, trabalho em grupos). Outro é a produção de minivídeos: usando celulares, câmeras fotográficas ou mesmo filmadoras (cada dia os primeiros com mais qualidade, os segundos mais baratos), em trabalhos feitos individualmente ou em grupo. Interessantes possibilidades nesse sentido podem ser vistas no Claro Curtas (www.clarocurtas.com.br) ou no Festival do Minuto (www.festivaldominuto.com.br).

Olá, gostaria de sua opinião sobre o uso de softwares específicos para auxílio ao processo de ensino-aprendizagem de portadores de deficiência visual.

Se o computador, o celular e a internet são formidáveis extensões de nossas capacidades para as pessoas sem necessidades especiais, para quem possui qualquer tipo de deficiência, visual, auditiva, de locomoção ou outras, a diferença é altamente impactante para um salto na qualidade de vida! No caso específico de pessoas cegas ou com visão subnormal, os softwares que permitem leitura automática, com voz sintética, possibilitam inúmeras aplicações no ensino e na aprendizagem.

Especialista ensina professores a usar a tecnologia como aliada na sala de aula

10/12/2010

DEZEMBRO 2010

Reportagem especial do jornal Zero Hora, feita por Juliana Bublitz, em 10 de dezembro de 2010, por ocasião da palestra de lançamento da publicação Tecnologias na Escola.

Para prender a atenção da gurizada

Para ajudar os professores a transformar as tecnologias da informação em ferramentas no processo de aprendizagem, o editor Carlos Seabra, palestrante do Fronteiras Educação – Diálogo com Professores, dá dicas práticas que podemser usadas na sala de aula. Entre elas, a “webgincana”. Confira.

Para ajudar os professores a transformar as tecnologias da informação em ferramentas no processo de aprendizagem, o editor Carlos Seabra, palestrante do Fronteiras Educação — Diálogo com Professores, dá dicas práticas que podem ser usadas na sala de aula. Entre elas, a “webgincana”. Confira.

Imagine a cena: irritada com alunos que não param de teclar ao celular, a educadora respira fundo, larga o giz, leva as mãos à cintura e ordena que os adolescentes desliguem os aparelhos. Do fundo da sala, em meio ao burburinho, ouve um protesto.

— Por que a gente não pode tuitar na aula? — questiona o guri de boné e roupas largas, cheio de razão.

Para o editor Carlos Seabra, palestrante do Fronteiras Educação — Diálogos com Professores, os estudantes não só podem, como devem. Coordenador editorial do Núcleo de Educação da TV Cultura, Seabra esteve ontem em Porto Alegre, no Salão de Atos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Para ele, não há saída: se quiserem falar a língua da gurizada, os professores precisam explorar o potencial das novas tecnologias:

— Caso não façam isso, correm o risco de ficar parados no tempo.

Português de nascença, o editor de 55 anos convidou o público formado basicamente por professores para acompanhá-lo em um passeio pelo que chamou de “jardim zoológico da tecnologia”. Para quem nunca (ou pouco) havia ouvido falar de Wikipédia e Facebook, ele fez as apresentações. E mais: deu dicas de como usar as ferramentas em aula.

Navegação

Como fazer os estudantes usarem a web sem apenas copiar dados? A dica é propor pesquisas e atividades nas quais os sites de busca não sejam o fim, mas o começo do trabalho.

Exemplo: Crie uma “webgincana”, pedindo que os alunos separem-se em grupos e pesquisem sobre um tema, com prazo determinado. A pesquisa poderá envolver textos, fotos, áudios e vídeos, que serão apresentados e debatidos com a turma. Como em uma gincana, as etapas do projeto terão pontuação para animar a garotada.

Principais sites de pesquisa:

Google (www.google.com.br): por meio dele, é possível buscar informações de quase todos os tipos e de várias épocas. Wikipédia (www.pt.wikipedia.org): é uma enciclopédia livre, feita com contribuições de internautas.

Celular

Embora algumas escolas proíbam o uso do celular, ele pode ser uma ferramenta muito útil na sala de aula. Mas como fazer os alunos usarem o equipamento de forma instrutiva?

Exemplo: Convide os estudantes a gravarem entrevistas em vídeo ou até um documentário com um telefone. O vídeo poderá ser sobre a escola ou sobre o bairro. Depois de pronto, poderá ser disponibilizado no YouTube (www.youtube.com), o maior acervo de vídeos da internet, e ser inserido em blogs e sites.

Os trabalhos podem ser individuais ou em grupo e variar de ficções a documentários.

Conversas na web

A comunicação via e-mail já está consagrada em muitas escolas, mas as conversas por mensagens instantâneas ou por chat ainda não são exploradas como poderiam.

O desafio do professor é trazer para o ambiente escolar essas novas ferramentas para que o aluno entenda a importância de escrever ao se comunicar com o mundo, mas como?

Exemplo: Peça aos alunos que, por meio de um desses programas, chat ou e-mail, conversem com estudantes de outras partes do Brasil. Que colham informações sobre a maneira como vivem e elaborem um trabalho individual ou coletivo sobre o assunto.

Ferramentas de comunicação:

MSN (www.windowslive.com.br) e Skype (www.skype.com). Os programas podem ser facilmente baixados na internet. Com eles, é possível conversar com uma ou mais pessoas ao mesmo tempo, fazer videoconferências e, em alguns casos, enviar arquivos, gravar vídeos e conversas.

Gmail (www.gmail.com), Hotmail (www.hotmail.com) e Yahoo! Mail (www.yahoo.com.br). Para criar uma conta em qualquer um deles, basta acessar as páginas e preencher os cadastros. Os e-mails são gratuitos.

Mapas digitais

Por que se restringir ao velho mapa pendurado na parede se hoje é possível usar programas como o Google Earth e mostrar regiões, países e cidades em detalhes?

Exemplo: Faça com que os alunos pesquisem sobre a vida do arquiteto Oscar Niemeyer nos sites de busca. Em seguida, peça que descubram e assinalem no mapa virtual onde estão suas obras no mundo. Ou, durante as aulas de história, mostre os contornos atuais do Império Romano.

Programas de mapas na internet:

Google Maps (http://maps.google.com) e Google Earth (www.google.com/earth), ambos com acesso gratuito.

Redes sociais

Pesquisas recentes revelam que as redes sociais vêm sendo mais usadas para comunicação entre jovens do que os e-mails.

A cada dia surgem novas opções, e o professor pode tirar proveito disso.

Exemplo: Peça para seus alunos entrarem no Twitter (www.twitter.com). Como o formato de postagem de mensagens não permite mais do que 140 caracteres, desafie a gurizada a demonstrar uma ideia, resumir uma informação, transmitir um conceito, escrever microcontos, de acordo com o objetivo da aula.

Fonte: Tecnologias na Escola, de Carlos Seabra – Fronteiras do Pensamento.

Perguntas para o especialista
A pedido de Zero Hora, cinco professores da Capital elaboraram perguntas para o palestrante Carlos Seabra. Confira as dúvidas apresentadas e as respostas do especialista:
De que forma usar as redes sociais como ferramenta para o ensino de língua inglesa?
“As redes sociais facilitam muito o ensino de qualquer idioma. São uma ferramenta fantástica, porque a pior coisa é você aprender uma língua só na base da gramática. Os professores podem usá-las estimulando os alunos a falarem com jovens de outros países a partir de tarefas específicas. Mas isso deve ser feito com um fio condutor. Os estudantes precisam ser orientados quanto ao assunto tratado.”
CALHANDRA PINTER, Inglês
Como eu poderia usar as redes sociais nas aulas de geografia?
“Você pode mesclar o uso das redes sociais com um software de mapas, como o Google Maps, e inventar uma viagem, criando um roteiro e assinalando os locais na tela. Uma ideia é refazer, por exemplo, os caminhos da Coluna Prestes ou passar pelos lugares onde grandes navegadores estiveram. Você vai conhecendo o mundo, até porque nos mapas virtuais há fotos. Você pode pedir que os alunos procurem músicas e comidas típicas dos locais visitados. O principal é soltar a imaginação.”
KENNY BASTOS, Geografia
O telefone celular poderia ser incorporado à sala de aula como mais uma ferramenta para a construção de conhecimento?
“Tem de ser. O celular é um pequeno computador, manda mensagem, é máquina fotográfica, gravador e agenda. É inconcebível que a escola não use o celular na educação, e que ele seja proibido. Por que não permitir, em uma prova, que os alunos usem o celular como quiserem, mas exigindo que respondam de modo criativo? O celular pode virar uma ferramenta interativa de pesquisa com recursos que estão fora da sala de aula.”
TANIA IWASZKO MARQUES, Psicologia
Se a maior parte das escolas não tem aparato tecnológico suficiente, quais são as alternativas para o professor?
“Os impedimentos secundários. Vamos lembrar de quando surgiu a TV. Só da classe média alta para cima havia acesso. Os educadores tiveram uma posição omissa, dizendo que poucas pessoas tinham os aparelhos. Ficaram para trás. Com os computadores, é a mesma coisa. Hoje, é difícil encontrar alguém que não tenha acesso a e-mail. É importante que se preparem para usar o computador, mesmo que não o tenham.”
WAGNER CÉSAR BERNARDES, Matemática
De que forma o uso das tecnologias pode substituir a figura do professor? Como fica o papel dele, tendo em vista esses novos recursos?
“Eu diria que o professor que pode ser substituído por um software ou por uma máquina deve ser substituído. O computador deve ser encarado como uma ferramenta. Quanto mais o educador entender o que se passa no cérebro de seus alunos e usar o computador como uma ferramenta, mais ele será insubstituível. O computador sem o professor não é nada.”
BRUNO ORTIZ, História

Abaixo, original da reportagem, em formato PDF:

Preconceito é principal adversário dos games na Educação

20/10/2009

OUTUBRO 2009

Entrevista dada a Letícia Cardoso, do Universo EAD, do Senac SP, em 15 de outubro de 2009.

Para especialistas, projetos de jogos elaborados com forte base científica podem ajudar a superar barreiras e a conquistar, de vez, as salas de aula no Brasil: um potencial ainda inexplorado.

Um em cada quatro jogos produzidos no Brasil tem propósito educativo. Pode parecer muito, mas, na opinião de especialistas, esta proporção poderia ser maior e contribuir mais para a melhoria da Educação. E os números do setor – tabulados pela Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (Abragames) – ajudam a revelar que, no país, os jogos educacionais, eletrônicos ou não, têm um enorme potencial a ser explorado.

“Um game feito para ser utilizado em sala de aula tem um público muito diversificado e precisa agradar a meninos e meninas, além de pessoas que gostam de ação, ou não. O som tem de ser pensado para dar mais vida ao jogo, mas de uma maneira que, se o fone de ouvido quebrar – o que é comum em escolas – o jogo não fique ‘manco’ sem ele”, ensina Roger Tavares, professor-doutor do Centro Universitário Senac.

Os benefícios dos jogos na Educação não são novidade no meio acadêmico. Mas, para usá-los é preciso sabedoria. “O potencial educacional de um jogo é revelado por sua proposta de uso. Por exemplo, um game de aviação com pousos e decolagens, navegação por mapas e até mesmo combates, ambientado na Segunda Guerra Mundial, poderá ser usado por diversas disciplinas, como História, Geografia e Matemática”, explica Carlos Seabra, coordenador editorial do Núcleo de Educação da TV Cultura.

Experiência real

Nesses projetos, o perigo de “errar a mão” no desenvolvimento e o risco do produto final ser enfadonho, despertando menos interesse e interação dos alunos, é enorme. Seabra diz que o segredo do sucesso está na vivência de situações que permitam ao jogador experienciar uma realidade, que não deixa de ser real, embora virtual.

Isso pode abranger desde conteúdos cognitivos muito específicos, como uma simulação de viagem dentro de um corpo humano, no espaço ou em uma máquina do tempo, até situações que impliquem na construção de competências e habilidades – como planejamento de ações, trabalho colaborativo, dedução lógica e reconhecimento de padrões.

E, no processo de criação desse tipo de jogo – seja para educação escolar, capacitação profissional ou outro objetivo – é fundamental levar em conta quais os conteúdos cognitivos, as competências, as habilidades, os fatos, os processos e os princípios serão necessários ao jogador.

Seabra aponta também que é preciso garantir a jogabilidade, o interesse, a interação entre os jogadores, a fim de assegurar que a experiência vivida no jogo possa ser transportada para outras situações, permitindo abordagens conceituais, teorização dos fatos e processos vivenciados.

Aval científico

Se há potencial e os especialistas conhecem os caminhos a serem trilhados, o que falta para que os games sejam adotados em massa para todos os fins educacionais?

Para Carlos Seabra, o uso efetivo de games na educação está vinculado à necessidade de criar condições e conquistar espaço e tempo. Na prática, diz o especialista, o atual esquema educacional impede que professores usem games – a não ser em pequenas experiências específicas – na escola.

“Um professor que usar contínua, consequente e estruturalmente os games na educação terá sérias resistências da administração da escola, dos pais de alunos, de seus pares e até dos próprios educandos”, explica Seabra. “As possibilidades são inúmeras, o objetivo é desejável, os resultados podem ser relevantes, mas o processo de aplicação não é nada fácil e exige a mudança de inúmeros paradigmas; não devendo ficar apenas nas mãos dos professores.”

Uma estratégia que poderia ser adotada, segundo o especialista, é realizar experiências específicas, com acompanhamento dos processos cognitivos envolvidos, interação entre os alunos e com o professor e dos impactos na aprendizagem. Esse levantamento deve ser feito com métricas, envolvendo avaliação de psicólogos e outros profissionais.

Somente a abordagem científica permitirá que o uso de games na educação deixe o gueto e ganhe possibilidades de uso continuado e estrutural na educação. “Enquanto a situação ficar limitada à meia dúzia de entusiastas sem bases mais sólidas em temos de conceitos pedagógicos e resultados de difícil comprovação, será difícil reverter esse quadro”, lamenta.

O professor-doutor Roger Tavares, que é game designer e editor da Comunidade Gamecultura (www.gamecultura.com.br) – atualmente faz pesquisa de pós-doutoramento sobre inteligência e videogames –, complementa a opinião de Seabra, dizendo que não basta desenvolver um conteúdo mais comercial e divertido para que usuários achem divertidos e passem a gostar de aprender. “O próprio nome, ‘jogo’, já traz muto preconceito. E é difícil quebrar esta barreira, mas não impossível. Nos últimos anos, têm aparecido coisas muito interessantes nesta área”, ressalta.

Proibir ou não proibir, eis a questão

21/01/2009

JANEIRO 2009

Entrevista dada à jornalista Maria Eduarda Mattar, do Guia das Cidades Digitais, em 21 de janeiro de 2009.

Criados para levar acesso à internet a um contingente de cidadãos excluídos do uso das tecnologias digitais, os telecentros eram peças raras no quebra-cabeça de inclusão digital até alguns anos atrás. Originalmente sua função era a utilização do cidadão com vistas à transformação social. Pela natureza do serviço, eram concorridos e somente as necessidades mais básicas – email, pesquisas escolares, busca de empregos, comunicação com familiares distantes – costumavam ser feitas ali. Quando servidos de banda larga, eram ainda mais atrativos.

O tempo passou e a realidade mudou: hoje eles são mais encontrados até em pequenas cidades, a disponibilidade de conexão aumentou e, na esteira, vêm mudando os perfis de seu uso e de seus públicos. Muito contribuiu para isso a expansão, mesmo que contida, da banda larga. Apesar de ainda raros nas pequenas cidades, links mais potentes são uma realidade cada vez mais fácil e disponível em muitas capitais e cidades medianas. Consequentemente, nos telecentros, os usos mudaram, tendo em paralelo a popularização de sites de redes socias, os serviços de mensagens instantâneas e sites onde o próprio usuário coloca conteúdo na rede mundial de computadores.

Neste contexto, assistir a vídeos no Youtube, fazer upload de fotos para ábuns na web e bater papo via MSN são atividades das mais corriqueiras nos telecentros. Como eco dessas novas formas de interagir com a web, surgem esporadicamente críticas a esse tipo de uso, que consome muita banda de internet nos telecentros. Há até quem sugira que sejam criadas proibições de certos tipos de utilização. Afinal, as duas coisas se chocam e são contraditórias? Ou é natural que um tipo de uso mais voltado ao entretenimento tome lugar nos telecentros?

Carlos Afonso, diretor-executivo da ONG de inclusão digital RITS, acredita que os telecentros são “um espaço de internet, para a comunidade interagir com internet, da mesma maneira que teria a oportunidade de interagir em sua casa, livremente”. Ou seja, um lugar onde as pessoas poderiam se apropriar das novas tecnologias, do modo e com o objetivo que lhes for melhor.

Ele lembra que os usuários dos telecentros são jovens em 80% ou 90% dos casos. “O que se vai querer fazer: transformar o telecentro no local da professorinha severa que ele já tem na escola? Aquele é um espaço de criatividade, de liberdade, em que ele vai navegar na internet. Claro que tem que ter orientação, e para isso os telecentros costumam ter cursos. Mas proibição nenhuma”, defende o diretor da Rits, organização que monta e gerencia telecentros, tendo participado da implementação das mais de 100 unidades do governo municipal de São Paulo.

Carlos Seabra, coordenador do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais e Tecnológicos (IPSO), concorda: “Restringir sites visitados e outros tipos de uso é um uso idiota das possibilidades das tecnologias de informação e conhecimento”, classifica. Para ele, tudo o que não seja atividade ilícita ou criminosa deve ser permitido. “A visão de que inclusão digital não passa pelo uso de comunicadores (como o MSN) ou redes sociais (como o Orkut) é equivocada. A visão ‘original’ de telecentros onde existem aulinhas de informática e as pessoas usam somente para serviços de e-gov e para busca de emprego, ou mesmo para atividades de estudo, é que é equivocada – o que não quer dizer que telecentros devam ter o mesmo comportamento que lan houses “, explica Seabra.

O IPSO, organização chefiada por ele, é responsável, em parceria com o Ministério do Planejamento, pelo mapeamento dos telecentros no país, através do Observatório Nacional de Inclusão Digital (ONID) [veja matéria do Guia sobre o assunto]. A iniciativa registra a existência de mais de 5 mil telecentros no país. Porém, os números podem ser maiores, uma vez que o cadastramento de unidades no portal é espontânea.

Já estão nessa base de dados muitos dos Centros Digitais de Cidadania (CDCs), os telecentros do governo estadual da Bahia, montados e geridos pelo programa Cidadania Digital, da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTI). Em outubro de 2008, o projeto baiano já registrava mais de 500 unidades no Estado. Neles, a proibição também não é regra. “Tem que deixar a tecnologia entrar no dia-a-dia das pessoas. Os cdcs são de uso público. Tem que conviver com os Orkuts e msns. Às vezes as pessoas precisam se comunicar com a família, tirar dúvidas, fazer contato. E essas são formas atualizadas de se comunicar”, diz a diretora do Cidadania Digital, Rúbia Carvalho.

Carlos Afonso sublinha que a existência ou não de proibição pode também ter a ver com o próprio objetivo inicial do telecentro ou do programa dentro do qual ele foi criado: “Não tem uma lei ou norma ou regulamento para criar telecentro. Cada um cria o seu, como achar melhor. Se existir uma política nacional que destine recursos públicos para criar telecentros com determinado objetivo, vão ter este tal objetivo. O governo de São Paulo, por exemplo, cria os infocentros, que são só para serviços de e-governo. É uma política rígida”, exemplifica.

Mesmo assim, Afonso – vencedor do prêmio de Personalidade do Ano da revista “A Rede” em 2008 e conselheiro da ONU sobre assuntos de governança da internet – reconhece que prefere a opção em que a liberdade de navegação é maior. “Os telecentros que nós [da RITS] criamos ou ajudamos a criar, como foi com os da prefeitura de São Paulo, têm outro objetivo, muito mais amplo, de agregar a comunidade em torno daquela possibilidade de usar a internet para potencializar a presença da comunidade, as relações da comunidade com as informações, criar iniciativas novas na comunidade usando essa ferramenta. Então, é um espaço com muito mais liberdade do que outros burocraticamente criados. Os dois porém são igualmente legítimos””, avalia.

Para Seabra, existe uma coisa que justificaria a proibição, temporária, de downloads: conexão muito lenta. “Claro que pode haver bons motivos pra bloquear o acesso a downloads ou streaming de música ou vídeo onde a banda já for suficientemente estreita, em nome da navegabilidade de todos. Assim como eventual bloqueio a sites de pornografia explícita, cadastrados um a um quando ocorrer abuso, também pode ser legítimo num espaço onde a imagem de um computador possa ser visualizada por outros usuários”, reconhece, ressaltando em seguida: “Mas toda e qualquer restrição deve ser muito bem pensada e de preferência discutida com os usuários, além de explicitada”.

Carlos Afonso tem uma opinião um pouco diferente. “Nos telecentros livres, genéricos, proibir site e proibir navegação não pode ocorrer. Nem proibir banda, pois os telecentros já têm uma banda tão miserável que não faria sentido”, diz, questionando e alertando: “A gente luta contra as leis restritivas da internet e vamos restringir justamente os jovens que vão usar a internet nos telecentros? É preciso ter cuidado com isso”.

De olho na inclusão

08/12/2008

DEZEMBRO 2008

Entrevista dada a Igor Ribeiro, da Revista Imprensa, em 8 de dezembro de 2008.

Sobre o Projeto de Lei 84/1999

“A PL exige que os servidores guardem por três anos seu conteúdo. É como se exigisse que as operadoras de celular grampeassem por três anos as conversas de todos, como se a discussão que tem sido polêmica sobre grampear alguns, passasse para um debate sobre grampear todo mundo por default e guardasse essas conversas por três anos. Mas isso iria aumentar absurdamente os gastos – e a internet no Brasil já é uma das mais caras do mundo, então tem um fator de natureza econômica e de viabilidade. Obriga, por exemplo, a você que tem uma rede wireless aberta a mantê-la fechada, porque você passa a ser responsável pelo sujeito que esta trafegando ali através do seu sinal. Isso vai contra a filosofia das cidades digitais, por exemplo, de doar sinal aberto. O mesmo pensamento nos levaria a dizer ‘as ruas são um elemento de crime, porque os ladrões usam a rua. Então deveríamos colocar guardas em cada esquina e para pessoa que andar um quarteirão, deveria ter seu RG verificado’. Muitos assaltos usam veículos motorizados, então também, teria que fazer um imenso controle sobre os automóveis que trafegam por aí. Ou seja é uma síndrome do vigilantismo, termo usado pela Carta de Belém [documento oficial da 7ª Oficina para Inclusão Digital]. Então, porque não se faz um controle autoritariamente rigoroso sobre o uso do celular, o uso do automóvel ou o uso das ruas, como se está propondo para a navegação pelas bandas digitais? E a internet já é completamente rastreável, por meio do IP dá para saber pelas máquinas por que passou. A banda aqui já é lerda e cara, isso só iria piorar. Fora a violação de direitos. Eu, por exemplo, sou escritor, e ao comentar sobre uma obra minha, inédita, com outras pessoas pela internet, é capaz que tenha cópia dela não-autorizada em outros lugares. Não estão falando de evitar a pirataria, evitar a cópia ilegal de filmes e músicas? Então isso levaria a uma violação, ao se manter nos servidores conteúdos de natureza sigilosa, seja uma obra artística ou arquivos de empresas, etc., que não tem nada que ser monitorados. É a mesma coisa que todos os telefones serem gravados.

O PL foi aprovada no Senado e, agora, está na Câmara… Mas houve pouca mobilização, muita gente não conhece, você por exemplo não leu. Ela é muito ruim, deveria ser tirada da pauta, mas no mínimo esperamos que se adie a votação para poder discuti-la melhor.”

Altos preços da banda larga

“A queda do preço depende muito da influência do governo. O governo é um grande comprador de serviços e ele tem que usar essa força enquanto um indutor, um formulador de políticas públicas, enquanto um normatizador, estimulando a concorrência. Na maior parte dos lugares não há concorrência. A gente fez uma pesquisa com lan house no interior e a maioria não tem a menor condição. Quando teve o apagão da Speedy, quartéis, hospitais, delegacias e o próprio governo ficou na mão. Porque você não tem alternativas de conectividades, não tem disputa de mercado.

O governo tem que colocar parâmetros na suas próprias compras. O governo do Estado de São Paulo é o maior comprador da Telefônica e talvez não exija o suficiente. Temos falado, por exemplo, em convergência de mídias, e a TV digital vai ter banda sobrando, porque não vai ser usada em conectividade? Você tem empresas que são donas de determinado serviço de cabeamento e não deixam passar o cabo de outra empresa por ali [pelo mesmo condutor]. Então tem que colocar melhores parâmetros, para aumentar a concorrência.

A internet é como estradas, por exemplo. E ao fazer estradas, como o governo atua? Ele estrutura a estrada primeiro e, depois, dá concessões de pedágio e manutenção à iniciativa privada. As infovias tinham que ser a mesma coisa. O Gesac é uma espécie de gambiarra para fornecer provisoriamente sinal em lugares que tem conectividade ruim, mas o governo tem que investir nas infovias, em fibra óptica.

Qualquer estrada deveria ser uma estrada digital também. Porque ao longo dela você poderia passar um cabeamento óptico. É uma solução muito mais barata do que usar rádio, por exemplo. Wireless é complementar, é muito legal como solução para a última milha. Mas você tem que ter auto-estradas. Grandes espinhas dorsais, depois as costelas e daí vem a ossatura menor. Fibra óptica ainda não decolou porque a priori exige um investimento maior. Mas o reflexo disso vem depois, na forma da economia de todo um país, que vai além do cidadão comum. As próprias empresas e organismos governamentais vão ter, em poucos anos, a recuperação econômica de um investimento em banda larga, larga mesmo.”

Variedade de projetos de inclusão

“Essa diversidade de projetos é uma grande riqueza. Seria não só impossível padronizar isso como também indesejável. Mas é necessário um mínimo de articulação, porque do jeito que esta agora é um caos total. Cada um está fazendo uma coisa sem integração, sem troca de informação. Agora que o governo apóia uma ação pública do governo federal interministerial para inclusão digital, com parte dessa integração com atividades estaduais, municipais e de parceria com sociedade civil, agora talvez melhore.

É fundamental uma política de bolsas para monitores. Muitos trabalham voluntariamente e outros recebem quantias muito pequenas dos projetos nos quais participam. Essa política de bolsas será implementada e deverá ter uma verba substancial do total planejado. Isso é fundamental. E é preciso ter uma rede de capacitação. Como se fosse bibliotecas, que precisam de monitores bem capacitados e que se comuniquem entre si. Muitas vezes o monitor de um projeto do Gesac não se comunica com um do Banco do Brasil, com um do governo estadual, não há uma articulação em rede. Ao se criar isso, vai se permitir uma troca espontânea de informações nessa rede, que funcione de uma maneira muito mais inclusiva e não piramidal, como vem sendo feito, que é ruim, impositivo e pouco democrático.

Pontos de cultura não dão acesso à população, mas trabalham outro aspecto importante dessa inclusão que é a digitalização da cultura. Não adianta você botar na internet um monte de gente para acessar conteúdo pela primeira vez na vida e ver um monte de página em inglês. Então os pontos de cultura são outra faceta que diz respeito à inclusão da nossa cultura no mundo digital.

Escola é outro ponto de inclusão digital e, cada vez mais, faz menos sentido pensar em escolas desconectadas. Tinha muito professor na Oficina [de Belém] e isso é ótimo. O governo prevê, aliás, oficinas menores, regionais e temáticas ao longo do ano, para quando ocorrer, no fim do ano, já tenha um acúmulo e um debate articulado antes. Então escolas também têm a ver com inclusão digital do aluno, do professor e das famílias, que também vão freqüentar as escolas.

O governo federal também teve grande participação ao diminuir os insumos de computadores para a população da classe C poder comprar, em muitas prestações, seu primeiro computador.

Celular acho que é fundamental, um computador que esta no bolso de todos brasileiros. O equipamento que mais se disseminou. Se você for ver quando o brasileiro atingiu os primeiros 50 milhões de rádios foi um tempo, os primeiros 50 milhões de TVs foi outro tempo, mas os 50 milhões de celulares foi uma fração desse tempo. Hoje são 140 milhões de celulares. Uma senhora me contou que na cidade dela não tem nenhuma operadora de celular, mas todos os jovens andam com celular no bolso. Eles usam como câmera, máquina de filmar, agenda pessoal de compromissos… Na hora que chegar a operadora lá, já vai ter milhares de pessoas com celular.

Tráfego de informação passa por diversos meios. Assim como quando a gente precisa viajar: pega um ônibus até o aeroporto, embarca num avião até o destino e, chegando lá, toma um táxi até um metrô, etc. Essa complementaridade que tem no destino do tráfego de átomos do nosso corpo, também tende a existir no deslocamento da informação. Não existe um único jeito. A informação vai passar por vários meios e a inclusão digital tem que passar por isso.

Vários telecentros proíbem, por exemplo, o uso de jogos, de MSN, o que é um absurdo. Porque um jogo te dá uma familiaridade. E se a gente está falando em democracia, porque um jovem de classe média que tem um computador excepcional e um jogão pode, e um pobre que tem que ir ao telecentro não pode jogar? Tem que ir numa lan house? Claro, o telecentro não é uma lan house, tem que ter limites, mas tem que ter abertura, porque há jogos que trazem conhecimento e a estratégia lúdica tem que ser usada. Principalmente para educação. Os telecentros tendem a focar muito em curso. Eles são espaços de aprendizagem, mas não são escolas. Não são adequados e não podem ter esse papel.

Temos agora, por exemplo, o dia da consciência negra. Por que não mandar os alunos irem para suas casas ou bairro, localizar um parente distante ou alguém da vizinhança que tenha tido um avô escravo, ou que tenha sido dono de escravos, e entrevistar e gravar o áudio com seu celular, e levar para a escola e em grupos de quatro ou cinco alunos cada um fazer um blog coletivo, em vez de um trabalho [tradicional]? Os professores reclamam tanto que a internet facilita o “copiar” e “colar”. Isso porque eles dão trabalhos burros! Você pode dar um trabalho inteligente: faça um blog contando histórias da sua comunidade em vídeo, em áudio, com foto, colocando onde essas pessoas foram localizadas no Google Maps, você vai ter um aprendizado de inclusão digital muito grande. Vão aprender a publicar, a fazer links, a editar algo multimídia, a colocar uma legenda, enfim… E isso leva o grupo de alunos a discutir. Encontram, por exemplo, 40 links [relacionados ao assunto]: vai por todos? Não, vamos escolher 15 e colocar. Vão colocar duas horas de vídeo? Ninguém vai ter saco de assistir. Então eles vão precisar reduzir, vão ter que tomar decisões. Isso é válido para a escola e para um telecentro. Isso vale para oficinas sobre livros, por exemplo, fazer edições caseiras de contos ou romance, o que é uma forma muito mais produtiva de ensinar a mexer num editor de texto. Fazer um boletim de parede se for caro reproduzir [em papel]. Fazer uma agência de noticias, com as informações da sua comunidade, as pessoas não reclamam que os jornalistas só publicam o que o dono do jornal quer? Então porque não criar um jornalismo comunitário? Em vez de um curso de planilha eletrônica para uma dona de casa, aulas sobre como planejar os gastos domésticos com planilhas do computador para as compras de supermercado.”

Observatório Nacional de Inclusão Digital

“Existem cerca de 800 cadastrados no Brasil. A meta é terminar o ano com cerca de 2 mil conveniados.

A iniciativa privada tem ações muito pequenas nesse sentido. São pontuais. A maioria das empresas, quando fazem, é para ter um case de sucesso, dizer ‘olha como somos bonzinhos, olha, isso aqui a gente apóia…’ São defeitos de comportamento, usando nessa atividade uma lógica da atividade empresarial, mantendo certo sigilo, não fazem uma experiência aberta, não é open source, não compartilha os motivos que levaram ao sucesso e escamoteia o que deu errado. Por um lado não tem escala, e o pouco que poderia trazer em experiências, relatos e trocas, acaba não rolando. O pessoal tem um pensamento muito de marketing e não de investimento público.

Então, mesmo quando tem, essa articulação é pequena, não há uma rede. Os projetos de inclusão do governo estadual não se comunicam com os do federal porque são de partidos diferentes. A mesma coisa com empresas, que não se comunicam por causa da grife, da marca da concorrente.

O que essas empresas discutem ou propõem, por exemplo, para incentivar ou apoiar as lan houses, por exemplo? Não tem linhas de atuação interessantes, não tem política nesse sentido. Acho que o poder publico não tem que investir em lan houses, assim como não tem que investir em livrarias. O estado tem investir em bibliotecas e telecentros. Mas como dá isenção de impostos para livros, tem que ter algo semelhante para computadores. Sei que o Sebrae, agora, está discutindo o lançamento do Sebrae digital e uma das ações será uma política de fomento a lan houses, que é uma atividade de micro e pequenos empresários, muitos na informalidade. Então há sim setores em que o governo atua, mas o resto depende da iniciativa privada, e como as empresas podem ajudar nisso? Talvez até produzindo equipamentos diferenciados para a lanhouse.”

Entrevista sobre microcontos à Revista Minguante

08/08/2007

AGOSTO 2007

Entrevista concedida à publicação bimestral online Minguante – Revista de Micronarrativas, e publicada em sua edição nº7 (agosto de 2007).

Carlos Seabra, quer pelas quantidade e qualidade dos seus pequenos textos quer pelo uso preferencial dos novos meios para a sua divulgação, pode facilmente ser considerado como um mestre de uma novíssima arte, e foi assim pensando que decidimos entrevistá-lo. As suas respostas só não excederam as nossas expectativas porque estas eram já muito elevadas.

Minguante: De onde vem o seu interesse por um formato breve, quer sejam haicais quer sejam micronarrativas, que tem desenvolvido de igual modo?

Carlos Seabra: Acho que em tempos de comunicação eletrônica, seja na internet ou cartazes na rua, mensagens de texto em celulares ou camisetas, há todo um conjunto de formas de comunicação atuais que permitem e pedem que a microliteratura as utilize.

Para mim, essa entrada na micronarrativa deu-se através da micropoesia, que é o haicai. Para mim isso traz um prazer lúdico muito grande, conseguir criar algo com limites tão minimalistas.

Minguante: Sei que em tempos tentou criar um serviço de microtextos para serviço de celular. Poderia falar sobre isso, quer no que se refere à história dessa tentativa, quer aos propósitos por detrás dela?

Carlos Seabra: Na verdade, tratou-se de uma iniciativa que não foi minha mas sim do Luiz Mendonça, que criou um serviço chamado Celuler. Tinha trovas, quadras, aforismas, haicais, de diversos autores contratados (como Alice Ruiz, Paulo Franchetti, Eliana Mora, Ricardo Silvestrin e outros). As pessoas compravam um “celulivro” – composto por 45 mensagens – e ofereciam a alguém por ocasião festiva ou não, ou mesmo para desfrute próprio, e durante quarenta e cinco dias era enviado um SMS.

Ao conversar com o Luiz Mendonça, que contratou meus haicais, disse-lhe que não teria produção tão grande nem como escrevê-los por encomenda, mas que adoraria escrever microcontos e sentia que poderia fazê-lo em larga escala. Dito e feito, passei a escrever microcontos durante os vôos para reuniões em outras cidades, nos congestionamentos na cidade e até mesmo no banheiro ou em momentos de insônia… e em dois meses tinha escrito mais de trezentos microcontos, procurando fazer uns cômicos, outros eróticos, outros meio surreais, outros maldosos ou cruéis, sempre pensando em um produto que não cansasse os leitor que os receberia diariamente no celular.

Infelizmente, a iniciativa foi inviabilizada financeiramente pela operadora de telefonia móvel que na ocasião detinha a maior parte do mercado brasileiro, o que fez o projeto ser abortado, os leitores ressarcidos do que haviam pago, e os contratos com os autores desfeitos, com enormes prejuízos empresariais para este precursor – ao qual agradeço me ter dado o empurrão em direção à criação de microcontos.

Minguante: Tem publicado em livro mas também tem usado o formato digital. Pode falar-nos de como encara um e outro meio no seu percurso?

Carlos Seabra: Publiquei o livro pelo Massao Ohno, o maior editor de haicais no Brasil e que teve uma importância fundamental na escolha de quais publicar, bem como no incentivo a que o fizesse. Mas se os livros já pouco vendem no Brasil (infelizmente, uma das maiores mazelas desta grande nação!), pelos de poesia então poucos editores se interessam, distribuidores e livreiros menos ainda. Tirando pouquíssimos lugares que têm meu livro à venda (Haicais e Que Tais), vendi a maioria no dia do lançamento e boa parte acaba indo como cortesia a amigos e conhecidos que volta e meia me pedem.

Assim, colocar o que escrevo na web é a melhor forma de ser lido. Aliás, tudo o que escrevi até hoje tem geralmente sido primeiramente publicado na web e somente depois ganha eventuais suportes de papel. No entanto, nunca escrevi um haicai ou um microconto no computador, sempre o faço em pequenos cadernos de bolso ou guardanapos de papel, com lapiseira preferencialmente, mas com caneta se estiver mais à mão. Acho que a publicação digital não canibaliza a publicação em papel, ao contrário, pode até ajudar a promover sua divulgação e venda (desde que haja distribuição, obviamente).

Minguante: Será a micronarrativa um novo género, que para além do mais ganhe ainda mais sentido com a utilização dos meios electrónicos?

Carlos Seabra: Não quero afirmar algo tão peremptoriamente, pois que para que possamos definir a micronarrativa como um gênero há que ter um pouco mais de produção, de distanciamento histórico, críticos engajados em analizar esta produção. É muito fácil escrever pequeníssimos textos e grandessíssimas porcarias. Não digo isto para depreciar a maioria da produção de microcontos (ou nanocontos, ou minicontos, ou haicais), que julgo muito sofríveis, mas também com a visão que é uma excelente porta de entrada para as pessoas se soltarem e começarem a escrever. Inclusive uma interessantíssima possibilidade de trabalhar a criação literária na escola, espaço tão tradicionalmente usado para fazer os alunos odiarem a literatura e terem medo do nosso idioma.

Como você aponta, o uso maciço dos meios eletrônicos faz com que os microtextos ganhem todo o sentido e sejam importantes conteúdos para popular áreas desertificadas de conteúdos culturais das novas tecnologias de informação e comunicação, como os celulares e tantos outros microespaços. No momento, inclusive, eu estou a preparar uma intervenção com haicais e microcontos na Internet 3D, na forma de uma galeria de microtextos dentro do Second Life – aliás, um belíssimo ambiente para este gênero.

Minguante: Diverte-se a escrever, disso ninguém duvidará, mas será para si a escrita de microtextos puro divertimento?

Carlos Seabra: Está bem próximo do puro divertimento, sim. E isso não é um conceito desqualificante, pois na sociedade pós-industrial, o ócio e o lúdico resgatam seu conceito mais profundo, existencialmente falando. Não se trata apenas de um novo epicurismo, mas cada vez mais o lazer, o ócio qualificado, o esporte, a diversão enfim, são até mesmo pujantes produtos econômicos. Finalmente, a cigarra vende seu cantar para as formigas cansadas de só trabalharem.

É nesse sentido que eu encaro o puro divertimento da escrita de microtextos, do qual faz parte um desafio interno para mim mesmo, e me solta para eventualmente vir a produzir textos literários maiores que micronarrativas. Como disse acima, a produção de microcontos começou com um viés econômico, tratava-se de um serviço, de um produto, com resultados a serem palpáveis financeiramente (o que não deixa de ser um outro tipo de divertimento).

Minguante: Depois de cortar e enxugar o texto o que fica é o essencial? Como trabalha os seus textos e o que procura alcançar?

Carlos Seabra: Confesso que não gosto muito de cortar. Quando me pedem textos com, por exemplo, quatro mil toques, acabo escrevendo seis ou sete mil e depois gasto a maior parte do tempo a tentar enxugar o texto até ficar perto da demanda. Com os haicais isso não existe, pois eles já nascem dentro de um padrão bem definido de três versos de cinco, sete e cinco sílabas. No caso dos microcontos, procuro ao máximo já os escrever no tamanho adequado e raríssimamente tive que podar alguma coisa.

Como adotei o formato de 150 caracteres, contando espaços e pontuação, acho que as idéias já nascem quase do tamanho certo. O haicai me deu a experiência de trabalhar estruturalmente com os limites. Sempre procuro ter uma frase que introduza a cena, que construa ou sugira a situação, e outra frase pra terminar, de preferência levando alguma surpresa ao leitor. Claro que nem sempre sigo essa fórmula. Algumas idéias de haicais que não deram certo viraram depois microcontos. Alguns fiz por referência pessoal (morte de um amigo, vivência de uma situação, mero devaneio interno) e podem ter outras leituras. Alguns homenageiam lembranças literárias (escrevi um pensando no Mário-Henrique Leiria, que me contava muitas histórias malucas quando eu era criança), outros são evoluções do próprio texto que nem eu quase tive intenção mas foram se formando.

Procuro alcançar a diversidade, como estrutura lúdica subjacente. Depois de escrever um ou dois mais sensuais ou eróticos, é bom escrever um bem cruel e malvado, depois uns dois meio de crônica do cotidiano, e então meter uma crítica de natureza política ou social, para então produzir alguo bem absurdo, surreal. Pensei isso para dar texturas diferentes para o leitor, mas também me impedem de cansar ou cair na mesmice.

Minguante: Sei que aprecia especialmente o sorteio para apresentação dos microcontos. Por alguma razão especial?

Carlos Seabra: Acho uma forma muito interessante de leitura. Apresentação de pequenos conteúdos de modo aleatório faz sucesso desde que existe o I-Ching e achei que seria um interessante formato. Fiz um site de sorteio de haicais (Caixa de Hai-Kai) no qual várias centenas de haicais de algumas dezenas de autores são apresentadas na tela, sorteando até mesmo a cor das letras, sempre em fundo preto. Aliás, foi a feitura desse website que me levou a escrever haicais, pois no começo eu estava era a estudar uma linguagem de programação (PERL) e precisava sortear coisas. Achei que haicais se adequariam e peguei vários em livros que tinha na minha estante, outros busquei na internet, e de repente achei que poderia até escrever um ou outro e colocar no meio.

O sorteio desconstrói caminhos e pode levar à experimentação e fruição de conteúdos que doutra forma não seriam conhecidos (a tendência de ler-se alguns autores apreciados pode levar a não conhecer o único microconto bom de um escritor que você sempre pule). Isso vale para poesia, micronarrativas, versículos da Bíblia, frases famosas, fotografias…

Minguante: A minificcção, diz-se, desesenvolve-se no limite dos géneros. Os seus haicais não são, de alguma forma, tão minificcção quanto os seus designados microcontos?

Carlos Seabra: Encaro o haicai como algo diferente da ficção, ele tem que ser poético, tem que produzir uma imagem cinematográfica dentro de nossa cabeça, tem que ter algo que não está em nós mas sim na natureza. Claro que eu brinco além disso em meus haicais, por isso inclusive chamei de “que tais” os que não são puramente haicais, mas sim que usam seu formato e algo de seu espirito para pularem o limite do gênero.
Mas você tem razão quanto a boa parte deles (tanto haicais quanto microcontos), que não fosse o fato de estarem num formato (três versos no caso dos haicais) bem que poderiam assumir a outra forma. Meu haicai “no despenhadeiro / a sobra da pedra / cai primeiro” poderia muito bem ter virado um nanoconto… Aliás, muita gente trata indiferenciadamente como microcontos tudo o que é pequeno, mas eu gosto de conceituar como nanocontos os que trabalham com o limite de 50 letras, microcontos os que usam o limite de 150 caracteres, e minicontos os que consideram até 300 palavras ou ainda 600 caracteres.

Minguante: Você conhece bem a lingua portuguesa que se fala em Portugal e no Brasil pela sua condição, julgo que de dupla nacionalidade. Se quisesse falar um pouco sobre isso eu agradecia.

Carlos Seabra: Sim, nasci em Lisboa e moro em São Paulo. Vim para o Brasil com 6 anos e voltei para Portugal com 10. Desde os 14 moro no Brasil, mas sempre tive um pé em cada lado do oceano. Mais da metade dos livros que lia na minha adolescência eram portugueses (desde toda a Argonauta de ficção científica, os policiais da Vampiro, até nossos escritores, Eça de Queirós, Virgílio Ferreira, Manuel da Fonseca, Júlio Diniz etc.) e sempre tive muita facilidade em transitar entre ambas as formas de grafia, tendo inclusive, já adulto, trabalhado na área editorial a copidescar (rever e adaptar) edições da Editora Abril, quadrinhos e novelas, para Portugal.

Escrevo meus haicais e microcontos com a língua que cá se fala pois seria muito estranho não o fazer, e aprecio muito as diferenças do idioma tanto em Portugal e no Brasil, como os enriquecimentos africanos e todos os demais que fizeram e fazem deste nosso idioma o que permitiu Fernando Pessoa dizer que “minha pátria é minha língua”.

Minguante: Ainda que saibamos que daria “pano para mangas” não resisistimos a pedir-lhe que fale um pouco do escritor Mário-Henrique Leiria, primo do seu pai, e que você conheceu pessoalmente.

Carlos Seabra: O Mário-Henrique Leiria era primo do meu pai (também Mário, e ambos se chamavam de “primários”). Desde que eu era miúdo, o Leiria era presença habitual em casa. Formava-se uma roda de amigos que ficavam a falar de artes e a tocar música brasileira. Até hoje tenho muito vivos esses momentos, de me emocionar, ainda criança de uns 5 anos de idade, ele acabado de casar com uma alemã que não me recordo o nome, algo como Fipsy, de quem ele se separou pouco depois. Achava muito engraçado o fato de ele barbear não só a cara mas a cabeça toda também, que o deixava com um ar de tartaruga sem casca. Isto lá por 1960. Meu pai tinha sido também o padrinho de casamento dele, e o Leiria era padrinho do meu irmão Eduardo.

Quando meus pais vieram para o Brasil, um par de anos depois veio o Leiria e ficou a morar lá em casa, num quarto nas traseiras sobre a garagem. Ele já tinha graves problemas de reumatismo e subia com dificuldades as escadas, com a ajuda de uma bengala e soltando cabeludos palavrões a cada degrau. O papagaio do vizinho aprendeu todos eles e retribuía-os, fazendo o Leiria passar a xingá-lo também, e eu e meus irmãos nos avisávamos e íamos todos a correr para assistir o espetáculo. Nessa época, lá pelos anos 1963/64, ele comprou-me um avião de montar, que exigia lixar as delicadas e inúmeras peças, colá-las, pintá-las, tudo seguindo uma detalhada e complicada planta e instruções. Claro que depois de muitos meses o avião mal tinha a estrutura do corpo, pois aquilo era só um pretexto para ele me contar suas aventuras na Guerra Civil Espanhola (muitos anos depois me dei conta, ao calcular datas, que tudo não passou de divertidas histórias, bem das dele, sempre numa fímbria entre o crível e o incrível).

Voltei para Portugal, onde residi e estudei uns 5 anos, participei de aventuras e descobertas arqueológicas com o Gustavo Marques, e das expedições etnológicas do Michel Giacometti, além de inúmeros outros intelectuais e gente engajada, escritores, músicos, pintores. Em 1969 cá estava eu de volta ao Brasil. Logo na primeira semana fui visitar o Leiria, que estava a trabalhar na Editora Samambaia.

Na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, já perto do centro de São Paulo, ao chegar lá vejo sair uma troupe de quatro ou cinco pessoas, com o Leiria à frente a imitar um helicóptero (mão na cabeça a girar as pás, boca a fazer o barulho das hélices), seguido de uma moça vestida de revolucionária russa, um exilado argentino logo a seguir a fazer nem sei mais o quê, seguidos pelo dono da editora, o Gil Clemente (com que mais tarde vim a trabalhar intensamente durante muitos anos), que só fazia olhar tudo com um ar aparentemente sério, fumando cigarros um atrás do outro. Eles estavam indo tomar um café numa pausa do trabalho. A editora publicava uma cômica revista de terror com o Zé do Caixão, editava antologias de erotismo (que belos e onânicos orgasmos me propiciaram), que entravam em choque direto com a cada vez mais feroz censura da ditadura militar (que, comparada ao plúmbeo ambiente do salazarismo e da PIDE, para mim era uma terra ainda assim de imensa liberdade), uma enciclopédia histórica (para a qual naquele dia eles produziram umas fotos que faltavam, de revolucionários bolcheviques para um verbete relacionado, embora uns 95% da obra fossem reais, mas eles gostavam de fazer).

Uma obra em especial me encantava (eu ia lá passar algumas horas, fascinado com o que era uma editora, e realmente acho que isso foi uma escola, pois com todo o clima surreal que de vez em quando até afetava o conteúdo, era uma editora mesmo; e talvez tenha feito com que alguns anos depois eu tivesse entrado nessa área profissionalmente), era um conjunto em três volumes, se não me engano, da Helena Sangirardi, uma famosa autora de livros culinários na época. Como ela demorava pra entregar algumas receitas que faltavam pra completar o número de páginas do volume que estava a ser finalizado, o Leiria resolveu ele mesmo produzir umas duas ou três receitas! Uma delas era o “Risoto à Mao-Tsé-Tung”, inocente receita onde ele só inventou o título. Outra descrevia um prato simples que consistia em abrir uma lata de sardinhas, uma lata de ervilhas e colocar uma folha de alface e “pronto, aqui está seu delicioso prato, minha amiga!”.

Se não me engano, foi em 1970 que ele voltou para Portugal, já todo “fodido das pernas” como ele dizia. Mas antes disso fui ainda visitá-lo no Hospital Samaritano, onde ele se recuperava de ter implantado uns metais a substituir parte dos ossos e tinha terríveis dores, que o suprimento de drogas que lhe davam não conseguia aplacar. Mas talvez eu nunca tenha rido tanto na vida, eu rebolava no chão do quarto do hospital, agarrado à minha barriga, que me doía de tanto gargalhar. A cada ataque de dor mais intenso ele usava seu repertório de palavrões, sempre vindo aos conjuntos concatenados deles, como a boa tradição lusitana manda, acrescidos de retoques que eram só dele – tudo isso acompanhado por comentários de humor surrealista e caras com olhos esbugalhados que não permitiam saber se ele estava a sofrar muito ou a se divertir à balda (com certeza os dois). Ele descrevia em detalhes a “guerra dos do segundo andar contra os do primeiro”, todos com almofadas a servirem de armas, no meio da noite. Ou picantes aventuras sexuais com as enfermeiras, onde me parecia que todas tinham enormes peitos mesclados com rígida disciplina germânica.

Foi depois disso que eu vim a ler seus Contos do Gin-Tonic, que ele editou já em Portugal e alguém me mandou. Nunca mais tive contato com ele, mas minha mãe, que estava a morar em Portugal, volta e meia contava notícias dele, que morava com a mãe e a tia, duas velhotas muito velhas mesmo, e que estava a cada dia mais “revolucionário”.

Mais do que um jogo em si, um prolongamento da vida real

02/07/2007

JULHO 2007

Entrevista dada à revista do Instituto Humanitas Unisinos, IHU Online, com o tema “Second Life, uma fábrica de sonhos e desejos”, em julho de 2007.

IHU On-Line – O Second Life pode ajudar a distribuir produtos culturais? De que maneira essa disseminação ocorre no universo virtual?

Carlos Seabra – Não colocaria como “distribuição” apenas, pois trata-se de um ambiente de imersão que permite a vivência de produtos culturais e educacionais, de lazer, atividades profissionais, enfim, é uma extensão da vida real. Outra característica do metaverso é a imersão, a vivência integral. Assim, no Second Life podemos ver um filme como se estivéssemos numa sala de cinema real, com boa qualidade. Isso permite que, além da distribuição, os produtos podem ser consumidos in loco, desde que digitais. Porém, certamente há a possibilidade, ainda mal explorada, de promover a distribuição de produtos virtuais que possam ser trocados por seus equivalentes reais. Isso pode aplicar-se a livros, discos, DVDs, software etc.

IHU On-Line – O entretenimento na internet está mudando? A tendência dos jogos online é seguir esse caminho? Por quê?

Carlos Seabra – A interatividade é o elemento central dos jogos na internet. O que não significa que seja sempre emulando a realidade. Há jogos onde o participante interage com bots (robôs de software), outros em que a interação ocorre em grupos que acabam se conhecendo, e outros ainda em que a interação se dá de modo anônimo, além das combinações entre todos esses elementos. Não vejo necessariamente um “caminho” tal como apontado na pergunta, que leve os jogos online na direção de interfaces, tal como o Second Life. Inclusive, só podemos chamar o Second Life de jogo se assim também chamarmos a vida (o que não deixa de ser), mas o Second Life é mais um prolongamento virtual da vida real do que um jogo em si. Ele é um ambiente inclusive onde podem haver vários jogos. Você poderá, com seu avatar, encontrar outro em frente a um tabuleiro de xadrez, e poderá entrar em ambientes no metaverso, onde ocorram jogos de diversos tipos.

IHU On-Line – Qual será a próxima novidade 3D na internet?

Carlos Seabra – A melhor forma de antecipar o possível futuro é olhar para trás, para tudo o que a humanidade já imaginou. Dos romances de ficção científica (Clifford Simak, em seu “Terra insólita”, previa interfaces holográficas interativas, casas dotadas de inteligência artificial e interface com reconhecimento de voz) às alucinações e magia de tempos medievais (nada mais parecido com isso do que o que a tecnologia já nos permite hoje!), tudo o que a humanidade já desejou ou imaginou é disso que a tecnologia se encarrega de viabilizar… As etapas já em estudo e testagem para a Internet 3D são a possibilidade de interação com voz (que não acabará, obviamente, com a interface de diálogos por texto), o uso de webcams para captar do usuário suas expressões e colocá-las em seu avatar (olhos arregalados, sorrisos, movimento das sobrancelhas, sincronia labial), e o sensoriamento dos movimentos corporais, permitindo que uma caminhada no Second Life queime boas calorias na vida real…

IHU On-Line – O Second Life gera algum impacto para o consumidor?

Carlos Seabra – Tal como na vida real, no Second Life gasta-se dinheiro e isso parece ser, inclusive, uma fonte de prazer para as pessoas, que também gostam de ganhá-lo, obviamente. Trata-se de um inteligente fator de sucesso do jogo: sua economia é real e engaja as pessoas em trocas, que fazem parte do próprio mecanismo lúdico (não é à toa que o jogo de tabuleiro mais vendido no mundo seja o Monopólio, no Brasil conhecido como Banco Imobiliário, um sucesso que existe há mais de 50 anos). Os impactos serão inúmeros, pois muitas e cada vez mais pessoas passarão a consumir produtos adquiridos via metaverso. Um celular virtual adquirido no Second Life permitirá à pessoa recebê-lo “de verdade” em sua casa pelo correio. Ou um voucher obtido no Second Life lhe dará um desconto real num aparelho de televisão ou computador numa loja real. A indústria e o comércio poderão antecipar lançamentos no metaverso, testando, desse modo, a reação do público e dimensionando estratégias de marketing, bem como adaptando seus produtos a tendências observadas no “metamercado”.

IHU On-Line – Quais são os impactos do Second Life no mundo do trabalho?

Carlos Seabra – No mundo do trabalho, na prestação de serviços, também poderemos ter grandes impactos. Reuniões virtuais entre funcionários de várias filiais (o que já é feito por quase quatro mil funcionários da IBM, por exemplo) permitirão dosar as viagens reais com seu custo em dinheiro e tempo, mais ainda em época de crise aérea. Cada vez mais, haverá um mercado de trabalho para avatares, para atendimento ao público e para operações mais sofisticadas – chegando um dia até a mesa de operações (por que não imaginar um especializado cirurgião operando através de um robô localizado numa pequena cidade longínqua, através de conexão de seu avatar com paramédicos locais e interfaces virtual-real?). Além dos aspectos acima levantados, é necessário também estarmos atentos para novas formas de conflitos e exploração do trabalho humano, pois um avatar de um apresentador de TV no metaverso poderá ter substituído seu ser humano por outro se houver conflito trabalhista ou contratual – do mesmo modo que um operador de uma máquina digital não precisará mais ser um ser humano, mas sim um avatar, e, neste caso, um operário brasileiro que esteja com salário muito elevado poderá ser substituído em minutos por outro nas Filipinas com uma remuneração cinco vezes menor!